sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Blair nega que invasão do Iraque visava a derrubar Saddam Hussein

Andy Rain/Efe
O ex-primeiro-ministro britânico Tony Blair afirmou nesta sexta-feira que a invasão ao Iraque tinha como objetivo acabar com as armas de destruição em massa (que nunca foram encontradas) e não derrubar o regime liderado pelo ditador Saddam Hussein. Blair dá seu depoimento, previsto para durar seis horas, ao inquérito no Reino Unido sobre o que motivou a participação britânica na Guerra do Iraque.

"O assunto absolutamente central eram as armas de destruição em massa", não uma mudança de regime, disse Blair, primeiro-ministro em 2003, ano da invasão, negando ter como objetivo derrubar Saddam.

O britânico ressaltou, contudo, que, "se necessário, e se não houvesse nenhum jeito de lidar com esta ameaça, nós iríamos removê-lo".

"O único comprometimento que eu dei, e eu o fiz de maneira muito aberta à época, era um comprometimento de lidar com Saddam", disse Blair.

O primeiro-ministro disse ainda que opções militares foram discutidas, mas insistiu que afirmou ao então presidente americano George W. Bush que queria esgotar todas as rotas diplomáticas antes de uma invasão ser considerada.

Blair disse ainda que outros líderes mundiais não dividiam o seu entusiasmo --e o de Bush-- para confrontar a ameaça de armas de destruição em massa. "Embora a impressão americana tenha mudado drasticamente [depois do 11 de Setembro, e francamente a minha também, quando eu falei com outros líderes, particularmente na Europa, eu não tinha a mesma impressão".

O ex-primeiro-ministro afirmou que o "cálculo do risco" representado pelas armas que supostamente o ditador iraquiano tinha mudou após os ataques terroristas contra os Estados Unidos em 2001.

Ao ser perguntado sobre sua estratégia sobre o Iraque, Blair disse que, antes do 11 de Setembro, achava que Saddam Hussein podia ser controlado com uma "política de contenção" e através de sanções. Sua decisão, afirmou, foi alimentada pelo temor de outros ataques terroristas semelhantes ao que os EUA presenciaram.

"O cálculo de risco mudou com os ataques nos EUA nos quais morreram mais de 3.000 pessoas. Se essa gente, inspirada por fanatismos religiosos, tivesse conseguido matar 30 mil, teriam feito, então cheguei à conclusão de que não se podia assumir riscos neste assunto", afirmou Blair.

Blair ressaltou ainda que esta posição era britânica e não dos Estados Unidos.

Manifestantes com máscaras de Tony Blair protestam diante da comissão de inquérito sobre o conflito


O governo de Blair é acusado de exagerar o risco imposto pelo ditador iraquiano para justificar a guerra. Bush já admitiu que foi um erro invadir o país com base no argumento de que havia armas de destruição em massa --nunca encontradas.

A decisão de apoiar a guerra foi a mais controversa dos dez anos de governo de Blair e causou ainda divisão no Partido Trabalhista.

Saddam fugiu quando as forças americanas, apoiadas pelos britânicos, invadiram o país em 2003. Ele foi condenado e executado em 2006.

Principal aliado de Bush na Guerra do Iraque, Blair será interrogado durante seis horas nesta sexta-feira sobre sua decisão de enviar 45 mil soldados britânicos ao país.

O presidente da comissão, John Chilcot, afirmou que o objetivo do interrogatório de Blair é descobrir porque o Reino Unido invadiu o Iraque, porque derrubou Saddam e porque em 2003.

Este é o terceiro e mais amplo inquérito sobre a Guerra do Iraque no Reino Unido. Ele não tem como objetivo apontar culpados ou dizer quem foi responsável pela guerra, mas tem potencial para prejudicar a imagem de britânicos e americanos depois de sete anos.

Os britânicos, até hoje divididos sobre o conflito, esperam que o testemunho do ex-primeiro-ministro aponte respostas sobre o objetivo e a legitimidade da guerra e sobre como e quando Blair decidiu apoiar os americanos com base no falso argumento das armas de destruição em massa.

A expectativa quanto ao depoimento de Blair foi tão grande que a comissão teve que sortear as 80 cadeiras disponíveis na sala entre mais de 3.000 pessoas. Entre os espectadores estão ainda familiares dos 179 militares britânicos mortos no Iraque.

Protestos

O depoimento de Blair atraiu ainda protestos aos gritos de 'Tony Blair, criminoso de guerra' do lado de fora do local do inquérito, em Londres.

Sete anos após a invasão e três anos depois de Blair deixar o cargo para o colega trabalhista Gordon Brown, a decisão causa protestos emotivos.

Familiares de alguns dos militares britânicos mortos na guerra se uniram aos cerca de 100 manifestantes que gritavam e carregavam cartazes do lado de fora do prédio.

Blair chegou cedo e entrou por uma porta lateral, sob forte segurança.

"A verdadeira questão que Tony Blair precisa responder no fim será em Haia e diante de um tribunal de crimes de guerra", disse Andrew Murray, presidente da Coalizão Stop the War. "Ele é um ator dedicado, mas eu acho que a maioria das pessoas já viu através do script".

A aparição de Blair pode afetar não apenas seu legado pessoal ao governo britânico mas o governo de Brown, então ministro de Finanças, que já enfrenta um momento difícil de crescimento da oposição dos Conservadores.

Alguns líderes trabalhistas temem que as declarações de Blair em defesa da guerra possa incitar sentimentos fortes nos eleitores e afastá-los dos trabalhistas nas eleições de junho.

"É um dia crucial para ele, para o público britânico e para a autoridade moral britânica no mundo", disse Anthony Seldon, comentarista político e biografo de Blair. "Este é um dia enorme e vai além dele e de sua reputação".

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